quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Na nossa forma.

O meu hiato literário é sempre reflexo de um período de aridez intelectual que acompanha, paradoxalmente, o cotidiano da minha vida acadêmica. Apesar de completamente entusiasmado com o meu avançar no campo das Ciências Médicas, sinto que cada vez mais me afasto de outras formas de pensar e analisar as coisas da vida. Vivo dizendo que a universidade nos faz perder a capacidade de poetizar, e é verdade.

Seres pensantes pensam. E pensar envolve dois movimentos básicos, porém opostos: decompor e recompor. Imaginemos quaisquer situações, das mais simples a mais complexa, e vejamos de forma prática como se processam essas ações. Uma situação nova sempre causa espanto e estranheza. Nossa mente não consegue alocar a novidade numa caixa já pronta de conceitos. Nesse momento, precisamos decompor e fragmentar o "novo" em partes com geometria e forma capazes de penetrar nos pequenos espaços vazios das nossas caixas mentais pré-fabricadas. Decompomos e decompomos até fazer sentido para nós, ou não. Decompomos para recompor. A recomposição nada mais é do que a "adequação", o colocar na forma, na nossa forma.

A forma (fôrma) do outro, raramente, consegue se encaixar na nossa. Sempre consideramos a nossa mais adequada. Temos essa necessidade. Não somos culpados. O nosso egocentrismo faz parte de uma característica evolutiva que remete a necessidade de sobreviver. Precisamos acreditar em nós (isso não é autoajuda!).

As universidades são esses lugares que me envergonham. Não se encaixam na minha forma. Elas, ao invés de expandiram, limitam. É tudo tão dividido, tão cêntrico. Tornou-se utopia acreditar que o conhecimento é algo unificador. Formamo-nos (ou seja, somos colocados em uma forma) e nos separamos das demais formas, ficamos conformados. O nosso movimento é sempre no sentido da especialização. Doutorados são feitos em um "canto de unha" e o "doutor" nem sabe o nome do dedo (nem na classificação de Eliana). Mais uma vez: não somos culpados. Dessa vez, podemos ser.

Sempre me disseram que após os 30 anos um dos fatores mais determinantes para a completude do sentimento de realização pessoal é o sucesso profissional. Não é o sucesso do conhecimento. Esse passa longe. O conhecimento passa longe das universidades que nos formam para esse sucesso profissional. Vivemos essa ilusão do saber, mas este nos engessa e molda. 

A decomposição deveria seguir-se a recomposição em uma nova forma. Entretanto, incorremos no erro de querer sempre encaixar no pré-pronto. Por isso, muitas vezes, ao pensar ou vivenciar coisas novas, só reforçamos nossos preconceitos. 

A relação entre universidade, preconceito e movimentos do pensar é tão próxima que assusta. E precisa assustar. Quando não assusta, é sinal de perigo. Quando não assusta é como se tudo encontrasse o seu lugar, como se tudo ficasse encaixado, na nossa forma.

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