E começaram a conversar. Ele
estava ansioso, pernas bambas, mãos inquietas, desviando o olhar dos olhos
dela, se ela visse descobriria tudo. Tomava a cerveja em doses fartas, para
ficar seguro e destemido. Sempre fora assim, não tinha muitas habilidades na
arte da conquista. Apesar de ser bom com as palavras, estas teimavam em fugir nos
momentos como esse. Qualquer assunto parecia inadequado, inoportuno. Não dava
para saber com o que ela iria ficar impressionada, o que a despertaria
interesse.
No bar, todo mundo parecia plateia.
A música de fundo não ajudava, não era nem um pouco romântica. Nada parecido
com o que ele tinha planejado. E arrancava um sorriso de canto de boca. Mais de
nervosismo do que de felicidade. Sim, ele estava muito feliz por tê-la perto
dele. Mas, aquele olhar dela... Deixava-o completamente desconcertado.
Os olhos dela são de uma cor de
mel, esverdeados, daqueles encantadores. Parecem desenhados, feitos à mão. É
mais incrível ainda o que ela consegue fazer com eles. Ela fita com segurança e
deixa ainda mais desconsertado o pretensioso interlocutor. Com aqueles olhos
seguros e cada vez mais brilhantes, naturalmente, ela desperta admiração e o
deixa inseguro.
Ela sabe o que ele quer. Todo mundo sabe. Até
os garçons já conversam entre si discutindo se o beijo sairá ou não. Mas ela
não deixa transparecer que sabe. Quer ser surpreendida. Ela sabe, também, que
qualquer olhar menos cuidadoso, qualquer palavra impensada, qualquer gesto
menos meticuloso será indicativo. Ele é um pouco mais velho, pensa ela. Deve
saber o que fazer. Eles sempre sabem, ou fingem. Ele parece tão seguro, tão
certo, tão obstinado, tão falante, cheio de piadas e argumentos, mas parece
andar em círculos, não sabe finalizar.
Na cabeça dele, ela já deve estar
entediada. Já acabaram todos os seus assuntos, todos os cantores e músicas já
foram citados, todos os livros, todos os programas de tv, todos os filmes, até
as novelas, um pouco de futebol, conversas acadêmicas, sonhos para o futuro, quantos
filhos são desejados... Mas, não teve a deixa. Ele não sabe como conseguir espaço.
Tem medo de ser invasivo demais ao tocar nas mãos dela de forma não casual. Ela
já entendeu que aqueles vários toques espontaneamente forjados não eram puro
acaso.
Talvez o problema fosse aquela mesa grande
demais, pensa ele, eles estavam distantes. Ele podia ter colocado a cadeira ao
lado da dela, não do lado aposto da mesa. Ele faz tudo errado. Ela o admira. No
fundo, ela sabe que ele procura uma deixa. Os sorrisos começam a surgir mais
espontaneamente, talvez pelo efeito da cerveja. Eles estão ali, como já fizeram
outras vezes, em outros contextos. Mas, naquele dia, era especial. Eram os dois
a sós, mais ninguém. Apesar do bar lotado e do olhar expectante vindo das mesas
ao lado. Nada mais importava.
Os olhares já estavam menos
envergonhados. Mais penetrantes. Mais intencionados.
De repente, ele para o olhar no
dela. É a deixa. Ele não tem mais dúvidas.
Ela sabe.
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